Saber quem de fato foi Dimas e se ele existiu mesmo envolve cruzar informações de duas fontes: de um lado, os textos apócrifos que falam um pouco sobre ele — considerando, é claro, que neles é difícil saber onde acabam os fatos e começam os mitos; de outro, o que se sabe sobre a prática da crucificação na Roma antiga.

Nominalmente, ele não é citado em nenhum dos quatro evangelhos canônicos — Mateus, Marcos, Lucas e João, os que constam da Bíblia.
Mas na passagem que descreve a morte de Jesus, os quatro evangelistas mencionam que, naquele dia, três pessoas foram crucificadas lado a lado.
João é o mais lacônico sobre isso. Ao nominar o local da execução, o lugar chamado Gólgota, ele afirma que “foi lá que eles o crucificaram juntamente com dois outros, um de cada lado e Jesus no meio”. E nada é dito sobre os outros dois.
Mateus e Marcos são praticamente idênticos nessa passagem. Afirmam que Jesus foi crucificado com “dois bandidos, um à direita, outro à esquerda”.
Em ambos, o trecho prossegue citando que o povo e as autoridades passaram a insultar Jesus. E termina ressaltando que “até os bandidos crucificados com ele o injuriavam da mesma forma”.
O evangelho de Lucas é o que traz a descrição mais curiosa sobre a interação que Jesus teria tido com os outros dois condenados.
Após enfatizar que o protagonista da história havia sido crucificado no centro, entre “dois malfeitores”, o evangelista também cita as zombarias da população e até de soldados.
Mas prossegue a narração incluindo os outros dois crucificados.
“Um dos malfeitores crucificados o insultava: ‘Não és tu o Messias? Salva-te a ti mesmo e a nós também!’ Mas o outro o repreendeu, dizendo: ‘Tu nem sequer tens o temor de Deus, tu que sofres a mesma pena! Para nós, é justo: nós recebemos o que os nossos atos mereceram; mas ele não fez nada de mal'”, diz o trecho.
“E dizia: ‘Jesus, lembra-te de mim quando vieres como rei’. Jesus lhe respondeu: ‘Em verdade eu te digo, hoje estarás comigo no paraíso'”, complementa a passagem do evangelho de João.
Para a tradição cristã, este criminoso acabou sendo classificado como “o bom ladrão”.
E tanto a tradição como pesquisas em alguns evangelhos apócrifos chegaram ao nome de Dimas como sendo a identidade deste cidadão.
O Martirológio Romano, o catálogo dos santos considerados oficiais pelo Vaticano, registra-o como o “santo ladrão, chamado Dimas, segundo a tradição”. E o define como aquele “que na cruz professou a fé em Cristo e mereceu ouvir dele estas palavras: ‘Hoje estarás comigo no paraíso'”.
Canonizado pelo próprio Jesus
“A tradição o faz padroeiro dos prisioneiros, condenados e ladrões arrependidos”, conta à BBC News Brasil o pesquisador José Luís Lira, fundador da Academia Brasileira de Hagiologia e professor na Universidade Estadual Vale do Acaraú, no Ceará.
Para religiosos e estudiosos de hagiologias, ele foi o primeiro santo da história.
“É interessante comparar um processo de canonização com a sagração de São Dimas”, comenta o pesquisador Thiago Maerki, associado da Hagiography Society, dos Estados Unidos.
“Porque ele foi declarado santo pelo próprio Cristo, foi Cristo quem o canonizou. Seguindo essa linha eclesiológica, embora não tenha sido uma canonização nos moldes convencionais, sua sagração seria de causar inveja a qualquer santo, a qualquer cristão”, acrescenta ele.
“Mesmo sendo a inveja um sentimento não aceitável para um cristão, estou falando só de brincadeira. Mas ser declarado pelo próprio Jesus é uma coisa única. E São Dimas recebeu isso.”
Lira concorda que “a pessoa representada no nome de Dimas” deve ser considerada o primeiro santo da história.
“É o bom ladrão. Uma das testemunhas do sacrifício maior de Jesus, a crucificação”, diz.
“Ele pediu a Jesus que se lembrasse dele quando estivesse no paraíso e Jesus confirmou que ainda naquele dia ele estaria ‘comigo no paraíso’. Podemos dizer que o próprio Cristo o canonizou, o elegeu, levando-o consigo ao seu reino.”
Saber quem de fato foi Dimas e se ele existiu mesmo envolve cruzar informações de duas fontes: de um lado, os textos apócrifos que falam um pouco sobre ele — considerando, é claro, que neles é difícil saber onde acabam os fatos e começam os mitos; de outro, o que se sabe sobre a prática da crucificação na Roma antiga.
Nos apócrifo
“Os evangelhos canônicos não registram seu nome. Somente a tradição e os apócrifos e, a partir dos apócrifos tem muitas histórias sobre ele, mas carecem de comprovação”, ressalva Lira.
“Ele não foi discípulo nem apóstolo de Jesus, contudo, na hora áurea em que Jesus disse ‘tudo está consumado’, ele estava ali bem próximo e, ao contrário do outro crucificado que pedia a Jesus para livrar-lhe da morte, ele pediu a salvação, diríamos, a melhor parte, no que foi atendido pelo próprio Deus filho, de imediato.”
