Conforme a pesquisa, o estado de Mato Grosso do Sul é o que possui a maior taxa de encarceramento de pessoas indígenas no Brasil.

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Um estudo inédito da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul aponta graves violações de direitos e da dignidade humana no sistema prisional na cidade em que há mais indígenas encarcerados no Brasil: Dourados.

O relatório foi produzido pela instituição por meio dos Núcleo Penitenciário (Nucrim), Núcleo de Direitos Humanos (Nudedh) e Núcleo de Defesa dos Povos Indígenas e da Igual Racial e Étnica (Nupiir) em parceria com a Defensoria Pública da União, Pastoral Carcerária, Instituto das Irmãs da Santa Cruz (IISC) e Conselho Indigenista Missionário (CIMI).

Conforme a pesquisa, o estado de Mato Grosso do Sul é o que possui a maior taxa de encarceramento de pessoas indígenas no Brasil. Dados nacionais da Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN), relativos ao período de janeiro a junho de 2023, apontaram um total de 1.226 pessoas indígenas presas no país. Neste mesmo período, o estado de MS custodiava 401 pessoas indígenas, representando praticamente um terço.

Diante dessas informações, entre os dias 26 e 30 de junho de 2023, a Defensoria Pública de MS, DPU e outros parceiros, promoveram, na cidade de Dourados, o mutirão de atendimento às pessoas indígenas privadas de liberdade na Penitenciária Estadual de Dourados (PED).

Dentre os presos foi encontrado um condenado com paraplegia e, durante o cumprimento da pena, foi encarcerado em condições precárias. Contou com a assistência da Defensoria Pública para a transferência ao regime domiciliar. A pena dele é de 131 anos.

Dourados é “presídio” de indígenas no Brasil

Dourados, maior município do interior do MS, é a cidade que encarcera a maior quantidade de pessoas indígenas do Brasil. Nele está localizada a reserva indígena com maior densidade populacional do Estado, cerca 20 mil moradores nos 3.539 hectares demarcados, concentrando os povos Guarani Kaiowá, Guarani Ñandeva e Terena.

Além disso, possui 15 áreas de retomada ocupadas por famílias indígenas que reivindicam a demarcação dos seus territórios tradicionais”, detalha o coordenador do Nuspen, defensor público Cahuê Duarte e Urdiales.

O quantitativo de pessoas indígenas privadas de liberdade informado pela PED na organização do mutirão era de 180 pessoas. Entretanto, o mutirão carcerário registrou o atendimento a 206 pessoas autodeclaradas indígenas. O que torna a unidade a que mais tem pessoas indígenas sem situação de cárcere do país.

“Além da subnotificação, tendo como base parâmetros nacionais e internacionais de acesso a direitos, foram constatadas outras a esses povos em privação de liberdade, como: o direito à documentação básica; à identificação; ao reconhecimento étnico; à autodeterminação; intérprete e laudo antropológico”, destaca a coordenadora do Nudedh, defensora pública Thaisa Raquel Defante.

Todas as violações foram constatadas após a aplicação individual de dois questionários com todos os indígenas encarcerados na unidade penal.

Em nota a Agepen:

A Agepen tem dado visibilidade às especificidades das pessoas indígenas custodiadas na Penitenciária Estadual de Dourados, para assim qualificar a execução penal, promovendo o direito à saúde, à educação, à assistência religiosa, à alimentação adequada, ao acesso ao trabalho, à segurança, à assistência jurídica, atendimento psicossocial e ao respeito aos seus familiares”.
Atualmente, conforme levantamento da direção do presídio, todos os internos indígenas possuem certidão de nascimento e CPF.
Em parceria com a 3ª Defensoria Pública Criminal de Dourados, foi solicitado ao Instituto de Identificação Gonçalo Pereira – IIGP a realização de um mutirão, dentro da penitenciária, para regularização e emissão de RG dos povos originários que cumprem pena na PED.
No próximo mês de maio, também haverá na PED uma ação de cidadania em Parceria com o SENAPPEN/AGEPEN, Fundação Fio Cruz, entre outros parceiros.
Além disso, inúmeras ações têm sido desenvolvidas junto aos povos originários custodiados no local, podendo citar:
• Há pessoas indígenas presas, estudando, trabalhando e em plena convivência como preconiza as Leis vigentes;
• Os presos, que se autodeclaram indígenas, são colocados em celas com seus pares, respeitando a sua individualidade, crença, costumes e idiomas;
• Nos pavilhões, local de convivência, os presos indígenas em casos emergenciais, existem indígenas com remição de pena, atuando como tradutores para melhor atendimento, e não há restrição em nenhum tipo de atendimento;

• Uma Policial Penal está em curso de qualificação Curso básico na Língua Guarani;
• Há um perito antropológico designado pela Vara do Tribunal do Júri e Execução Penal de Dourados, o Assistente Social – Leonardo Laurindo;
• Está em fase de implantação pela Escola Penitenciária de Mato Grosso do Sul, em parceria com a UFGD e UEMS, para realização de um curso instrumental na Língua Guarani, haja visto que a maioria de nossos privados de liberdade, são da etnia kaiowá e nhandéva;
• Todos os presos passam pelo processo de inclusão, pesquisa familiar, pelos atendimentos psicossociais, entrevista individualizada;
• Realização do projeto “Conhecimento para combater o preconceito – Dia Nacional dos Povos Indígenas”, durante este mês de abril. Parceria com o Centro Estadual de Educação de Jovens e Adultos (CEEJA). Consiste em atividades educacionais, promovendo discussão sobre a diversidade étnica, social e cultural no país.
• Importa elucidar também que o policial penal designado para exercer a função de chefe de segurança desta Unidade prisional é de etnia indígena, demandando um olhar especial para efetivar o atendimento a esta população em especifico, priorizando, a preservação da cultura.

Lembrando que essa questão do intérprete elencado é nas ações dentro do presídio e atendimentos internos. No processo judicial, já não é atribuição da Agepen, mas da própria defensoria e do judiciário.